ECK 7 anos: as conquistas do contraditório e da dialógica, por Manoel Fernandes Neto

Tempo de leitura: 4 minutos

Por Manoel Fernandes Neto

O aniversário de 7 anos da plataforma Espiritismo com Kardec (ECK), que engloba os mais variados meios digitais e presenciais, me traz memórias acolhedoras. De uns tempos pra cá, vivo de memórias, como se eu fosse acometido por todo tipo de epifanias das coisas que vivi: um filme, um clipe, uma música, um beijo, um termo, uma palavra, o gatilho, a cena, a lembrança.

Nem sempre coloco no papel esses jorros. Atualmente, me restrinjo a releituras do que escrevi, criação de textos muito específicos — autorais em diversos estilos —, além de trabalho de editor e curador, parte deste nas fileiras do ECK.

Um travessão, um convite:

— Estou montando um grupo sobre Espiritismo, quem sabe você quer participar, — falava Marcelo Henrique, o capo, o MH, o “meu editor”, o professor como muitos o chamam, acertadamente.

No princípio, declinei. Minha fobia social — online e presencial — , minha impaciência, perda de fé na humanidade e decepção com confrades e quetais, além do meu mau humor irrestrito, chegavam forte naquele ano de 2017. Mas, pela relação que tínhamos, confiei e entrei no ECK quando ainda “tudo era mato”, e os debates se multiplicavam, para o bem e para o mal. Depois de alguns meses, compromissos, uma “falta de tempo” e embates com alguns membros mais sectários me fez sair, não sei por tanto tempo. Outro convite um período depois, Marcelo Henrique dizia que havia colocado “ordem na casa” e retornei para nunca mais sair.

O hacker espírita

 MH merece alguns parágrafos à parte — sempre as memórias. O conheci nas lides espíritas da internet, quando eu era editor da revista NovaE e outros blogs, espíritas ou não. Não me recordo exatamente o momento. Ele, um entusiasta do Espiritismo laico, baseado na filosofia e na ciência, mas com foco em uma espiritualidade diferenciada, sem vícios e no estudo aprofundado de Kardec. Me surpreendi pelo seu conhecimento sobre a doutrina e outros temas, gostei de sua pegada sem “papas na língua” e vi que o chamado movimento espírita necessitava muito de Espíritos assim — destemidos — e que esse embate faria o MEB pensar em si mesmo.

Em 2008, estivemos juntos presencialmente pela primeira vez. Ele esteve na casa espírita da qual eu participo em Blumenau. Na palestra, falou sobre Jesus histórico com muita propriedade, o Magrão, como ele chama, para espanto do público em conhecer um outro homem de Nazaré.

Antes da palestra, eu, ele e sua companheira, Julia, tomamos café em uma padaria. Após os formalismos iniciais, nos vimos iguais e caminhantes das eras, falamos de família, de Kardec, de coisas divertidas, apontamos as mazelas do Movimento Espírita Brasileiro, sorrimos, contamos piadas, fincamos os pilares de uma relação que dura até hoje. Um parênteses: sua companheira, Julia, — grande amiga — esteve em todos os nossos encontros e também nas atividades. Ativa e atuante, é voz forte que inspira e colabora com as conquistas. Protagonista.

Um pouco depois, em 2011, quis entrevistá-lo para a saudosa revista NovaE, uma das pioneiras da Internet, no ar até 2014, e também para os portais GGN e Nova Era. Passei as perguntas provocativas e em pouco tempo já recebi as respostas. Percebi que estava com um personagem bem fora da curva, curioso, com ampla cultura do mundo, desbravador, um provocador como tantos que alcançaram novas visões do mundo.

Em um trecho da entrevista, vemos que MH, antes do ECK era o mesmo do ECK:

Que tal, então, imaginarmos que cada um de nós é parte integrante e responsável pela disseminação do conhecimento? Que tal envolver as pessoas, diretamente, na tarefa de perpetuação das informações de natureza espiritual (não somente as que foram trazidas em face do trabalho pioneiro e meritório de Rivail, mas a continuidade das comunicações mediúnicas e a respeitabilidade advinda da condição de verdade, segundo determinadas premissas de análise)? O “legado” de Kardec perpassa a ação consciente e dedicada de todo aquele estudioso que compreende os efeitos da mensagem espírita em si e busca disseminá-la para que outras pessoas possam ter acesso a ele, modificando-se e buscando a felicidade.

Com o material da entrevista em mãos, o título veio naturalmente: “O Hacker espírita”. Hacker da filosofia que utiliza conhecimentos disponíveis para transformar o mundo de forma criativa e inusitada, hacker do inconformismo e da paixão, hacker do novo, do faça você mesmo, do não tenha medo, da superação.

A força do ECK

Depois dessa entrevista e dos nossos contatos constantes, nos aproximamos ainda mais. Nas conversas, nas concordâncias e discordâncias e também em muitos debates políticos amplos e pontuais, com muitas coisas em comum e grande respeito mútuo.

Em 2013, novo encontro, desta vez em Florianópolis, no Curso de Formação de Pesquisadores Espíritas, desenvolvido pelo NEOPE-VPCC, da Federação Espírita Catarinense (FEC). A iniciativa inédita e de vanguarda unia a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) — pela extensão Universitária em Pesquisa em Transfenomenologia — e a Federação. Lá, estava o Marcelo como assistente da vice-presidência de ciência e cultura da FEC, trazendo a voz que deveria ser ouvida. Hoje, vejo o curso também como uma semente do que vivemos hoje no ECK.

O sintomático é que uma iniciativa tão intensa foi cancelada pela FEC após essa primeira edição, confirmando o porquê da existência do ECK hoje: o movimento espírita brasileiro, hoje representado pela FEB e seus seguidores incondicionais, não consegue conviver com o contraditório, a filosofia e a ciência. Desperdiça a individualidade de cada um, com rejeitos inconvenientes de igrejeiros em falas vazias de seus cardeais.

São muitas as histórias que ainda guardo do Marcelo Henrique e do ECK, mas o que importa mesmo nesses 7 anos é que ele construiu com esforço hercúleo um grupo gigante dentro do Espiritismo. Um autêntico think tank que hoje é referência na pesquisa e no estudo espírita, acertando muito, mas também sem medo de reconhecer erros e corrigir rotas para manter um grupo heterogêneo. Uma iniciativa que valoriza a produção literária de Kardec (suas 32 obras), com base no método lógico-racional aplicado aos diálogos entre Espíritos e na compreensão de temas relacionados à Espiritualidade e as Leis Divinas, o ECK está em todas as redes, em seu grupo no Facebook de 13 mil membros, em seu portal, nas suas lives com temas contemporâneos e no evento Fórum do Livre Pensar Espírita do ECK (LiPE), já indo para a 6ª edição. Veja neste link.

Esse diálogo com vários setores do Espiritismo, consigo mesmo e com seus membros, busca um engajamento inédito em um Espiritismo que traz novas visões — com Kardec — e projetos de interesse comum. Um espaço em que a potência das conversações, da dialógica e do contraditório navega em temas da atualidade planetária para uma lente espiritual-espírita — e também para não espíritas. Desafios que surgem e se renovam a cada dia com suas dores e prazeres. Unir é isso, sempre diz MH.

Longa Vida ao ECK, seus membros e Conselho de Gestão.

 

Imagem de Gerd Altmann por Pixabay

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Postagem efetuada por membro do Conselho Editorial do ECK.

9 thoughts on “ECK 7 anos: as conquistas do contraditório e da dialógica, por Manoel Fernandes Neto

  1. Bonaserata a todos, todas e todos. Gente amiga sou de Santos/SP e trabalho no Grupo Espírita João Cabete. Temos aqui muitas casas, com anos e anos e anos de tradição e engajamento mas o que pega e entristece é a alienação e completa ojeriza a discussões que nos coloque dentro da realidade que nos cerca e com a qual vivemos. Tradicionalismo é termo leve pra isso pois vemos aqui coisas absurdas que chocam e creio que vicês sabem o que estou falando. Digo sempre que não levou pra Casa Espírita minhas convicções políticas ou filosóficas mas respeito a tudo e a todos e nossa obrigação é sermos solidários e cristãos com todos que procuram a doutrina e em nosso cotidiano naturalmente. O que vemos é o sectarismo, a doutrina ultra direitista infiltrada e fazendo muito mal a corrente e a total falta de vontade para aceitar opiniões diferentes, divergentes e progressistas. Bem, como minha esposa diz, ” não podemos colocar as pessoas a frente da doutrina, julgar a doutrina por elas, nossa obrigação é fazer o melhor sem olhar a quem ou por que, não é mesmo .

  2. Manoel consegui colocar tudo o que é o ECK,, a sua essência, nada a acrescentar a não ser que Marcelo Henrique é um homem de coragem, não sabe fazer média com os conceitos da ciência e da filosofia, doa a quem doer, Parabéns ECK, longa vida, 👏👏👏👏

  3. Neco, sensacional o seu artigo! Tão rico sobre os fatos que fiz uma verdadeira viagem no tempo, com a sensação de que foi hoje o dia em que estávamos na referida padaria, nos conhecendo pessoalmente. Há tanta entrega, tanto carinho nas suas palavras, que é impossível não se envolver por tudo o que foi dito. O Marcelo é mesmo um idealista e um gênio criativo, que dá asas aos seus ideais, tais como a criação do ECK. Você é um diamante precioso no nosso grupo. Feliz por fazer parte disto tudo! Júlia.

  4. Manoel, não poderia deixar de passar por aqui para parabenizá-lo. Conhecer um pouco dos bastidores do ECK, através deste artigo repleto de sentimentos, ressalta o carinho e a amizade entre seus fundadores e membros. Estou extremamente feliz por ser ECKano.

  5. Tudo o que escreve sobre o MH o Grande impulsionador deste grupo o ECK, é a verdade insufismável de que ambos são tudo o que Kardec pensou ser…a continuação do seu sonho. Um Espiritismo laico, livre pensador , progressivo e progressista, sem peias religiosas. Já o repeti várias vezes, tendo uma satisfação enorme de fazer parte deste grupo. Longa vida ao ECK e ao seu Grande mentor ,o Prof Marcelo, gratidão.

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