O livre pensar espírita no ECK

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“Sabemos pouco. Não temos certezas definitivas. Mas ousamos buscar”.
Maurice Herbert Jones (1929-2021).

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Ao nos colocarmos em posição de LIVRES PENSADORES, estabelecemos algumas premissas importantes:

1) A obra espírita é MAJORITARIAMENTE de Allan Kardec. A ele coube a autoridade (praticamente solitária) de selecionar os textos obtidos a partir do intercâmbio mediúnico. Além disso, a organização de seus 32 livros, a aposição de comentários, notas explicativas, introduções e textos conclusivos, também mostra a FACE de Kardec presente em todo o Espiritismo;

2) Os Espíritos Superiores foram “identificados” por um critério PESSOAL de Kardec. Ele pode ter falhado nisto, ou seja, na identificação de que seriam (ou não) espíritos “superiores”? Sim, talvez.

E é importante não estabelecer premissas imutáveis para a conceituação dos espíritos ou para a consideração das mensagens que estão presentes em várias (senão todas) das suas obras;

3) Kardec pode ter se equivocado ao “selecionar” mensagens, construir argumentos e tecer conclusões. Notoriamente, Kardec, valendo-se de um dos critérios do próprio método que estabeleceu para o Espiritismo – o Controle Universal dos Ensinos dos Espíritos (CUEE), pode ter cometido erros, pois foi, acima de tudo, um homem – com seus atavismos e limitações da vida física, não obstante o seu quilate ESPIRITUAL, moldado pela sucessão das encarnações.

Atribuir perfectibilidade à tarefa, mitificar ou endeusar o personagem e sua obra são atitudes completamente contrárias ao “espírito” da Doutrina dos Espíritos;

4) Não há um quesito de PERMANÊNCIA ou de DEFINITUDE nas obras (ou nas informações nelas contidas). Kardec é repetitivo, pontualmente, para estabelecer que – fora os princípios, considerados praticamente como “cláusulas pétreas” da Doutrina dos Espíritos – tudo poderia ser revisto, reelaborado, reconfigurado, ressignificado. Somos nós, os espíritas, ao contrário dele, que ERIGIMOS as informações contidas em suas obras (mesmo aquelas assinadas pelo Espírito Verdade ou por “luminares” de todos os tempos, e aquelas inclusas em determinadas seções de sua obra, cognominadas de “Instruções dos Espíritos”.

Até que ponto, então, estamos dogmatizando e tratando como “definitivas” questões que podem ser, a qualquer momento, objeto de questionamento e, mais adiante, com o uso da lógica, do bom senso e dos próprios critérios mencionados por Kardec, reavaliados? Isto é fundamental para deixarmos de ser míticos, místicos ou atávicos em relação ao que está contido nas chamadas “obras fundamentais” espíritas;

5) Devemos examinar tudo. A nossa leitura – sem vaidade, orgulho, prepotência, autossuficiência ou pelo simples “prazer de contestar” – deve, então ser PERMANENTE sobre tudo o que Kardec assinou em suas obras (ainda que esteja, em alguns momentos, acompanhado de outras inteligências, de modo a particularizar e identificar determinadas mensagens). A obra é integral e complexa, devendo ser lida e entendida em conjunto, e não de forma estanque, dissociando o contexto dos capítulos, das obras ou de todo o conjunto kardeciano;

6) Retirada da impressão e da chancela de “verdade imutável”. Aquilo que Kardec (e os Espíritos) produziram, deve ser o ponto de partida de REINVENÇÃO do próprio Espiritismo, ainda que essa “reinvenção” seja a literal retomada daquilo que ele repetidamente prescreveu e estabeleceu como condição de continuidade da obra espiritista. Não é possível nem aceitável, do ponto de vista filosófico-científico, concordar com “revelações mediúnicas” posteriores a 1869, como complementares ou substitutivas de contextos kardecianos, somente com base na aparente erudição dos Espíritos comunicantes ou da autoridade moral de médiuns;

7) Kardec não é infalível. Vemos, aqui e ali, muitos espíritas preocupados em “defender” Kardec, a qualquer custo. Em estabelecer como “verdades inquestionáveis” o que esteja contido em uma resposta circunstancial a uma inteligente pergunta feita por ele, na chamada maiêutica kardecista, ou em uma dissertação igualmente perspicaz do nosso mestre francês, sobretudo na Revue Spirite. Outros, inclusive, dentro deste “espírito de defesa” não admitem, sequer, o contraponto, a cogitação de um “erro” interpretativo, ou da “falsidade” demonstrada no curso da própria evolutividade humana e social, de que uma afirmação tenha ficado desfasada, obtusa e seja inapropriada – até mesmo pela evolução legislativa, cultural, científica ou de costumes da raça humana.

Somos nós que não “queremos” ver Kardec contradito (ou em contradição) porque isto PODE representar nossa “perda de confiança” e a consequente CONFIABILIDADE no “ensino dos Espíritos”, essa pedra angular em que depositamos, não raro, muitas das vezes, o nosso padrão de vida, de existência, as nossas crenças (ainda que não religiosas), a nossa “fé raciocinada”, o nosso “bom senso”, a nossa “lógica”;

8) Divinização, não! Nós, humanos, Espíritos encarnados, costumamos adotar a DIVINIZAÇÃO (imposta, adquirida ou natural) de questões “espirituais”. Em parte por termos sido criaturas “embaladas” nos rituais religiosos de todos os tempos – e suas crenças correlatas – substituímos a “consciência” de outros credos ou seitas pela CONSCIÊNCIA ESPÍRITA. Assim, os espíritas em geral costumam se ancorar em zonas de conforto, considerando a Doutrina como um ponto de chegada, o ápice do entendimento das questões espirituais. Do contrário, o Espiritismo é, apenas e tão-somente, o ponto de partida para as perguntas, descobertas, revisões, abandonos, recontextualizações, permanentemente, pois o progresso é infindo;

9) Despir-se de atavismos. É preciso, independentemente do grau de estudo, experiência e tempo de atividades espíritas, se DESNUDAR. Abandonar o “sacro manto” das certezas “espíritas”. Como se eles, os Espíritos Superiores fossem definitivos, infalíveis, imutáveis. Kardec jamais disse que a Verdade teria sido dita ou a obra estivesse acabada! Este curioso ATAVISMO é o de todos os que, estando espíritas, se autoproclamam detentores de informações espirituais que a maioria da Humanidade desconhece (pelo menos “sistematizadamente”), ou para aqueles que entendem que a (mera) proximidade com os Espíritos nos dá a condição de permanência e infalibilidade, o que é um ledo engano; e,

10) Avançar no progresso do Espiritismo. Quando Kardec, lucidamente, apresentou a sequência dos períodos do espiritismo, como a enquadrar, histórica e socialmente, as “fases” em que o pensamento espírita (e espiritual-espiritualizante) estaria sendo maturado entre as sociedades humanas, neste minúsculo planeta azul, ele provavelmente acertou na identidade (nomenclatura) e na sucessão temporal deles. Mas errou, ufanisticamente, na questão cronológica. Tendo, já, passado os três primeiros (curiosidade, filosófico e de luta), estamos na linha limítrofe entre o quarto (religioso) e o quinto (intermediário) para, adiante, alcançarmos o último, dentro desta contextura, que é o de regeneração social. Quando falamos em “período religioso” não queremos, apenas, enquadrar aqueles que piamente creem no “tríplice aspecto”, os que têm certeza de que o espiritismo é uma religião (ainda que filosófica), e os que atentam para a caridade como forma de expressão máxima da religião cristã, nas “hostes” espíritas.

Devemos, também, abrir a alça de percepção e mira para enquadrar todos aqueles que veem o Espiritismo, em suas obras, letras e máximas, como UMA RELIGIÃO, pela adoção das posturas que exemplificamos acima, especialmente os critérios de INFALIBILIDADE, PERPETUIDADE e DEFINITUDE. Quando nos despimos destas amarras, abrimos corações e mentes para entender melhor a característica de permanente mutação da Filosofia Espírita, seja por novas revelações, seja pelo progresso das Ciências Humanas, seja pela evolutividade dos nossos próprios conceitos, experimentos, vivências e raciocínios.

Uma nova era – não aquela já enquadrada por “movimentos” ou “tendências” está a se instaurar, silenciosamente ou não, no próprio “movimento” espírita – que é o mais amplo contingente dos que estão INTERESSADOS pelas questões espirituais à luz dos princípios (esses, sim, imutáveis) da Doutrina Espírita.

Convido você a sair da sua “zona de conforto”. Convido você a repensar inclusive a forma pela qual você considera e vive o Espiritismo, em seu íntimo e em seus círculos de relacionamento. Convido você a experimentar estar NÚ, diante do que já existe, diante daquilo que você “crê” conhecer bastante ou profundamente. Essa experiência – ÚNICA – deixará valiosas sequelas positivas no TEU SER. Como teria dito um sábio da terra, a consciência cerebral que um dia despertou e se expandiu jamais retornará ao tamanho e ao estado original. Felizmente!

ESPIRITISMO com KARDEC (ECK).

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Postagem efetuada por membro do Conselho Editorial do ECK.

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