Herculano Pires (in memoriam)
O Prof. Denizard Rivail somente começou a se interessar pelos fenômenos espíritas aos cinquenta anos de idade, ou seja, em 1854 e, somente em 1857, publicou o primeiro livro doutrinário. Esse livro, aliás, tornou-se a pedra angular do Espiritismo, a obra fundamental da Doutrina. Foi a partir desse livro, “O livro dos Espíritos”, que a doutrina começou a existir.
Antes dele, só existiam os fenômenos e interpretações diversas dos mesmos. Kardec estruturou o Espiritismo e deu-lhe um nome, criando para isso uma palavra especial, um neologismo da língua francesa, que logo mais era traduzido para todas as línguas. A palavra Espiritismo é uma criação de Kardec, que a divulgou pela primeira vez ao publicar o referido livro.
Durante cinquenta anos, portanto, o Prof. Rivail preparou-se para o cumprimento da missão que lhe cabia na Terra. As pessoas que criticam esse fato, afirmando que Kardec só na velhice se lembrou dos fatos espíritas, esquecem-se de que as grandes tarefas exigem amadurecimento dos seus responsáveis. Também Jesus viveu trinta anos na obscuridade, preparando-se para a pregação do Reino, que só realizou nos últimos três anos de sua vida. Denisard Rivail estudou, desde muito jovem, magnetismo e hipnotismo, aprofundando-se no conhecimento dessas matérias, que muito lhe serviram, mais tarde, para compreender a natureza dos fenômenos espíritas. Por outro lado, os seus estudos de Medicina e de Pedagogia muito contribuíram para a posição objetiva e serena que tomou diante da fenomenologia espírita, não se deixando levar por conclusões apressadas, em nenhum momento.
A obra de Kardec provocou reações imediatas em vários setores do mundo cultural da época. As duas reações principais partiram da esfera religiosa e da esfera científica. De lado a lado havia grandes interesses em jogo. Kardec contrariava numerosos dogmas religiosos e abalava princípios fundamentais das ciências. Homens como William Crookes e Alfred Russel Wallace seriam convocados a se pronunciar a respeito dos fenômenos espíritas, a fim de liquidarem, com sua imensa autoridade científica, a “nova superstição”. Mas, assim como na esfera religiosa, houve sacerdotes e ministros que preferiram romper com suas igrejas a negar a evidência dos fatos espíritas, assim também na ciência, Crookes, Wallace e outros preferiram, honestamente, a verdade.
Essa atitude corajosa de vários luminares da ciência e da religião não foi suficiente para impedir a onda de ataques ao Espiritismo e, portanto, a Kardec e sua obra, que até hoje continua a rolar sobre o mundo. As instituições humanas são dotadas do mesmo instinto de conservação que caracteriza os homens. Reagem com energia diante de tudo aquilo que possa ameaçar-lhes a estrutura. Mas, o Espiritismo dispunha, por sua vez, de energia suficiente para enfrentar a luta e prosseguiu.
No terreno da ciência, apesar do materialismo dominante nos meios científicos, o Espiritismo impôs a realidade dos fenômenos em que se apoia e determinou o aparecimento de disciplinas importantes, com a Metapsíquica, de Charles Richet e a Parapsicologia, de Joseph Rhine, hoje admitida nos currículos universitários. Os princípios espíritas serão reconhecidos dentro de alguns anos pelos meios científicos mais adiantados. E Kardec, então, terá o reconhecimento que o mundo lhe deve, pelo muito que fez em favor da libertação espiritual do homem e da evolução do nosso planeta.