Busco na esteira do tempo o momento em que conheci Carlos de Brito Imbassahy
É fato que, antes, de nome, eu já o conhecia, por acompanhar seus artigos em jornais espíritas e por ter compulsado uma ou duas obras de sua autoria. Também associava seu nome ao do pai, Carlos Imbassahy, figura proeminente no espiritismo brasileiro.
Pela memória, registro as cartas que trocamos, numa época em que não havia e-mails, em que ele me contava fatos pitorescos da história do movimento espírita, seja os antigos, da época de seu pai, ou mais atuais, quando me enviava, em anexo, um ou mais artigos de sua lavra, bem como outros de sua esposa Carmem, para que eu publicasse na Revista Espírita HARMONIA ou em outros periódicos impressos ou eletrônicos. Era delicioso ler o Professor, nas suas narrativas e em muitos desabafos.
Assim como eu, Carlos sempre foi – e é – um inconformado em relação a muitas atitudes tomadas pelos espíritas, principalmente dirigentes ou líderes, assim como palestrantes e médiuns.
Seu comportamento lembra o de outro Professor, Herculano Pires, que faz parte da minha formação espiritual e ideológica, pela força que suas idéias impregnaram em mim em várias décadas, quase quatro, de convivência, minha, com a Filosofia Espírita.
Depois, veio o convívio em ferramentas e plataformas sociais.
Trocas de e-mails, conversações on line numa das “salas” do Pal-Talk e do TiVejo. E, mais recentemente, pelo Facebook.
Foi justamente numa dessas ambiências, num dos grupos em que participávamos, nas horas vagas, que surgiu a celeuma que envolve a publicação de “A Gênese”. Como Imbassahy utilizava, às mãos, uma edição no original francês – a rara, terceira, herdada de seu saudoso pai – à medida que as leituras e comentários ocorriam, ele ia apontando diferenças flagrantes entre os textos.
Lembro-me bem de sua indignação e inconformismo
De início, o Professor imaginava que o problema estivesse no tradutor, brasileiro.
Mas isso não era verdade! A edição tomada como base para as edições brasileiras, a quinta, era completamente diferente em muitos capítulos, em relação à que ele tinha em mãos.
Como ficava mais gritante a distância entre os textos, ele resolveu traduzir para o português aquela terceira edição (que, sabemos, é igual às duas primeiras e à quarta, pois somente a quinta é que tem o texto bem modificado).
É esse o espírito de fidelidade e respeito a Allan Kardec que reputo como característica fundamental desse físico, engenheiro, jornalista, escritor e pesquisador espírita, nascido em Niterói (RJ), em 9 de outubro de 1931.
Austero, de inteligência ímpar, mas de gestos e postura carinhosos e acolhedores, lembra a figura do físico, firme e seguro diante dos fatos e experimentos e o avô terno que ama seus netos.
É, assim, podemos dizer, uma lenda viva, da história, em face de tudo o que presenciou nestas muitas décadas de convívio e participação no Espiritismo. Uma de suas histórias mais interessantes e que eu sempre divulgo em palestras e conversações em que os temas permitem tratar é uma sequência de comunicações, psicofônicas, quando das reuniões mediúnicas feitas na casa de seu pai, no início do século XX, lá pela década de 1940, alertando para novos ataques – iguais aos que o Codificador havia sofrido, na Europa, por ocasião da resistência de religiosos católicos e protestantes em relação à mensagem espiritista – que a Doutrina dos Espíritos teria em solo brasileiro.
Diziam os Benfeitores Espirituais que:
cansados de combater o Espiritismo “de fora”, vários líderes religiosos do passado estariam se agregando e vinculando ao “movimento” dos espíritas, de dois modos: encarnados, como lideranças; e, desencarnados, como mentores e guias de instituições e médiuns.
Kardec havia previsto
Em uma belíssima dissertação na Revista Espírita (Revue Spirite), o chamado “período religioso” do Espiritismo – como prévio ao de transição que levaria, enfim e por fim, à regeneração social –, caracterizado pela forma maciça e predominante dos adeptos verem o Espiritismo praticamente como uma “religião cristã”.
Mas ele não anteviu que, neste processo de maturação das idéias espíritas, a circunstância apresentada nas mensagens mediúnicas que o Professor relatou estivesse presente, de modo a ameaçar o edifício espírita.
Daí a permanente necessidade de estudo, de divulgação das idéias contidas nas obras genuínas de Kardec e o nosso permanente esforço de preservação do edifício doutrinário de perigosos acréscimos que comprometeriam a obra.
O Espiritismo, para Carlos de Brito Imbassahy
Como ele mesmo repetiu em algumas entrevistas que lhe foram feitas, sempre lhe foi algo muito familiar, como aprender a falar, a andar, a ler e tudo o mais.
Respirava-se a Doutrina na casa de seus pais.
Mas ao lado desta naturalidade da convivência familiar, na forma de interpretação dos fatos cotidianos e na aplicação das verdades espirituais (transmitidas pelo Espiritismo) às circunstâncias da vida, Imbassahy sempre pontuou que a Doutrina dos Espíritos requer MUITO estudo – e hoje, diz ele, quase ninguém quer estudar.
Além do estudo, a perseverança nos trabalhos, principalmente os de natureza prática, as reuniões mediúnicas, voltados ao paradigma de Kardec, que é a evocação dos Espíritos Superiores para tratar de temas relevantes, e não os comezinhos e da satisfação da mera curiosidade.
Ele sempre se indignava com a enorme quantidade de “mensagens mediúnicas”, principalmente as falsas e as sem conteúdo.
Tendo, pois, exercido a cátedra, o magistério por mais de quarenta anos, o Professor Imbassahy – Prof. Imba, como eu sempre o chamei na intimidade respeitosa – esclarece que esta é a forma mais precisa de transmissão de conhecimentos.
Que as instituições espíritas utilizem essa ferramenta, na forma de debates e cursos regulares de espiritismo, não baseados em apostilas, mas nas próprias obras riquíssimas de Allan Kardec, com destaque para os artigos contidos na Revue, que são desconhecidos da grande massa que freqüenta os centros.
Um homem com permanente coragem de falar o que pensa, em lealdade aos princípios espiritistas, bradando contra as enxertias, as adulterações, os misticismos e a postura religiosista que, por vezes, é vista com proeminência em instituições, obras e eventos patrocinados pelo chamado movimento espírita brasileiro.
Certa feita, em contato mediúnico, mais recente, o pai, Carlos Imbassahy veio trazer-lhe mensagem dizendo para que não se preocupasse tanto com o “destino” dado por dirigentes e médiuns ao Espiritismo brasileiro, pois essa não seria a sua tarefa. E que uma plêiade de Espíritos, associados à doutrina, no momento oportuno, agiriam para “colocar as coisas no lugar”.
Este exemplo, estas orientações tem sido referências para mim, no trabalho cotidiano junto às atividades espíritas.
E, esperamos, seja para você, também!
* Texto elaborado para homenagear o Professor Carlos de Brito Imbassahy, tradutor de “A Gênese”, em sua edição original, para que a Fundação Espírita André Luiz (FEAL) publicasse a edição restaurada, lançada em São Paulo (SP), em 26 de maio de 2018.
Obras Publicadas:
- Pureza Doutrinária
- Energia Cósmica Fundamental
- Materialização de Espíritos / Ectoplasma
- A influência das Drogas no Perispírito
- Alma Grupo
- Apometria
- Os fundamentos de Allan Kardec
- Cientistas Espíritas
- Tangibilidade dos Espíritos
- Dúvidas sobre o Espiritismo
Foram excelentes os tempos em que no PalTalk nós ficávamos várias horas durante alguns bons anos ouvindo o mano Imba e o querido Tio Rai. Que gratidão eu sinto por ter aprendido com eles!