EDITORIAL: O compromisso de restaurar a obra e a verdade, por Marcelo Henrique e Nelson Santos

Tempo de leitura: 5 minutos

Por Marcelo Henrique e Nelson Santos

Seguimos apresentando, neste ano de 2023, nas edições mensais de nossa Revista Espírita Eletrônica Harmonia, matérias relativas à recuperação da edição original de “A Gênese, os milagres e as predições conforme o Espiritismo”, a derradeira obra de Allan Kardec. Neste número, inovamos com a apresentação, além dos artigos – em número de seis – uma entrevista com uma das responsáveis iniciais pelo trabalho de restauro deste livro.

Devemos lembrar, inicialmente, que a matéria está longe de ser pacificada, com a concordância entre os estudiosos. E isto não é prejudicial nem indesejado. Muito pelo contrário. Lembremos que o próprio Kardec realizou inúmeras vezes a análise de teses e antíteses, dos contraditórios em face de determinadas temáticas. Também ele se demonstrou disposto a enfrentar sérios debates com aqueles que se opunham à proposta e às teses espíritas. Assim sendo, na constância – até o presente – de argumentações favoráveis à tese de adulteração e contrárias à ela, o que se recomenda – que é o que o Professor francês também faria – é colocar, lado a lado as edições nos originais em francês, para observar, tópico a tópico o que foi modificado.

Já o dissemos, em sede do “Espiritismo COM Kardec – ECK”, que há alterações e adulterações. As primeiras correspondem, em distintas partes da obra, à inserção de textos que já tinham sido veiculados na “Revue Spirite”, praticamente “in totum”, ou com pequenas alterações, demonstrando que a autoria seria de Rivail. As segundas, no entanto, importam na inclusão de argumentos e textos que contrariam frontalmente a principiologia espírita – definida desde a publicação de “O livro dos Espíritos” e seguida nas demais obras – e, ainda, no sentido de muitas afirmações sobre tais temáticas, expressas seja nos livros considerados fundamentais como nos fascículos da “Revue”.

Eis a razão pela qual se deve ter muita cautela em asseverar que o conteúdo integral da quinta edição, póstuma, pertenceria à intelectualidade de Kardec e seria de sua autoria.

Seguimos publicando, então, artigos inéditos e efetuando a republicação de outros textos que, por seu relevantíssimo conteúdo, seguem como contribuições para o debate sobre a veracidade, autenticidade, fidedignidade, pertinência e coerência doutrinária.

Nesta esteira, Henri Netto postula: “Se adulteraram Jesus, por que não Kardec?”, fazendo a ilação entre o que muitos religiosos fizeram com os feitos, as pregações e os ensinos do Homem de Nazaré, para atender determinados interesses, alimentando dogmas e verdades absolutas, com os atos praticados por “continuadores” do trabalho de Rivail-Kardec, em relação às obras escritas pelo Professor francês. E o que é pior, decorridos quase 160 anos do trabalho pioneiro, pessoas se basearem em “documentos” e se revestindo como “historiadores”, na tentativa de recontar a história do Espiritismo.

Cristina Sarraf, em seu artigo “150 anos de “A Gênese”, de Allan Kardec e o escândalo Inevitável”, destaca a omissão dos dirigentes e editores espíritas na manutenção de traduções da obra derradeira de Kardec com o conteúdo da quinta edição, adulterada, deturpada e desviada dos objetivos pretendidos pelo criador do Espiritismo, já que o conteúdo desta edição póstuma e apócrifa destoa daquilo que preconizou o Mestre, nas demais obras de sua produção.

Um dos destacados estudiosos da matéria, Paulo Henrique de Figueiredo destaca o conjunto de levantamentos já realizados, em seu Pesquisas indicam alterações nos originais de Allan Kardec”, cronologicamente, para que o leitor possa ficar a par de tudo o que ocorreu na esteira do tempo, o que nos leva, como ele, a constatar “que trágicas circunstâncias históricas criaram uma nuvem de fumaça, de tal forma que as alterações não foram prontamente percebidas”. Paulo Henrique, assim, convidou – e nós atendemos – para que os interessados na manutenção do legado de Kardec, incólume e restaurado, deveriam prestar a Kardec tal homenagem.

“Em busca de respostas” é o sincero texto de Milton Medran Moreira, que centraliza em Pierre-Gaëtan Leymarie – um dos companheiros e, depois, continuadores da atividade espírita pioneira (século XIX) – a responsabilidade pelas alterações e adulterações realizadas em “A Gênese”, e que ele “não detinha qualquer autoridade para modificar a obra original de Kardec” e, em assim agindo, “cometeu um gravíssimo erro, mesmo que sua intenção tenha sido a de retificar outros possíveis equívocos”.

Sergio Aleixo, no seu “Tradutor, Traidor”, remonta a um célebre adágio que é repetido nas academias das Ciências por todo o mundo, em relação à circunstância de que os tradutores emprestam às obras originais que vertem dos idiomas originais para o vernáculo em que laboram, incrementos e alterações no pensamento dos autores. Aleixo ainda resgata situação que já era presente ao tempo de Rivail e que se acentuou no “meio espírita brasileiro”, de que após o desencarne do Professor francês, “algo de revolucionário apareceu em termos de fenômenos e de comunicações mediúnicas”. E, ilustrativamente, resgata a polêmica (já contextual no tempo do trabalho kardequiano), acerca do desaparecimento do corpo de Jesus, após o sepultamento: elemento que distancia Kardec de Roustaing e que, por isso, a adulteração procedida em “A Gênese” corrobora a tese rustenista do corpo fluídico do Nazareno, totalmente antagônica à explicação natural dada por Kardec e pelas Inteligências Invisíveis.

Reforçando a ideia que nós do ECK sempre esposamos, realizamos e continuamos incentivando os interessados, de realizar um circunstanciado estudo, lado a lado, entre as publicações, “Análise Comparativa Doutrinária das Edições de “A Gênese”, Marco Milani descreve, ainda que sucintamente, as atividades realizadas pelo Grupo Virtual de Estudos (GVE), organizado pelo Departamento de Doutrina da União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo (USE-SP), com dezesseis participantes, em que dois grupos chegaram a resultados diferentes de análise, ainda que parcialmente, demonstrando o critério do livre pensar que caracteriza o Espiritismo e concitando, inclusive, que outros estudiosos devam verificar, por si mesmos, “os eventuais impactos ocorridos”. Mesmo assim, parte significativa dos pesquisadores – diríamos, nós, do ECK, que estivemos representados por 5 (cinco) dos participantes, majoritariamente – considerou a quarta edição (publicada por Kardec, ainda em vida) “como a mais adequada”.

Por fim, resgata-se uma riquíssima entrevista dada pela Simoni Privato Goidanich, responsável pelo levantamento, em solo francês, das fontes originárias e da investigação nas repartições incumbidas do registro e do depósito legal das edições literárias, em Paris, feita por Eliana Haddad, em “A restauração do conteúdo definitivo: entrevista com Simoni Privato”, para apresentar o detalhamento da criteriosa pesquisa histórica, jurídica e documental “in loco”, realizada por Simoni. Para esta, o processo restaurativo de “A Gênese”, constitui-se como “fundamental não apenas para essa obra, mas também para as demais de Allan Kardec”, calcado em “traduções fiéis”, mas, além disso, voltado a esclarecer a questão da adulteração, propiciando, com a união de esforços da parte dos interessados “para que o conteúdo adulterado seja definitivamente substituído pelo que Allan Kardec realmente publicou”.

Reiteramos, então, nós do ECK, o convite já feito na edição anterior (Janeiro), para que cada leitor, estudioso e interessado na Filosofia Espírita, aprecie os textos e – mais que isso – acesse o conteúdo das duas edições, no original francês, para perceber as diferenças e debruçar-se sobre elas, em franco e respeitoso debate, como livre pensador, para valorizar ainda mais a produção kardeciana e reforçar o conjunto principiológico fundamental contido nas 32 (trinta e duas) obras do Professor e Mestre francês.

Isto porque, como coletivo espírita e como representativo dos que estudam com afinco e dedicação a Filosofia Espírita é o compromisso de restaurar a obra e a verdade!

ACESSE OS TEXTOS DA EDIÇÃO:

Se adulteraram Jesus, por que não Kardec?, por Henri Netto

150 anos de “A Gênese”, de Allan Kardec, e o escândalo inevitável!, por Cristina Sarraf

Pesquisas indicam alterações nos originais de Allan Kardec, por Paulo Henrique de Figueiredo

Em busca de respostas, por Milton Medran Moreira

Tradutor, traidor, por Sérgio Aleixo

Análise comparativa doutrinária das edições de A Gênese, por Marco Milani

A restauração do conteúdo definitivo: entrevista com Simoni Privato, por Eliana Haddad

Written by 

Postagem efetuada por membro do Conselho Editorial do ECK.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.