Esse livro mudou a minha vida, por André Marouço

Tempo de leitura: 3 minutos

André Marouço

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“O Filme dos Espíritos”, premiado como Melhor Roteiro no Festival SESC Melhores Filmes, narra a história fictícia de um homem que, desesperado pela viuvez de sua amada esposa, procura uma ponte sobre o Rio Tietê, para atirar-se sobre suas águas poluídas e “dar fim” à própria vida. Mas, havia um livro…

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Ao abrir pela primeira vez “O livro dos Médiuns”, eu não podia imaginar que estava lendo uma obra posterior àquela que pode ser compreendida como a mais importante obra literária espírita de todos os tempos: “O livro dos Espíritos”, a pedra fundamental da Filosofia dos Espíritos.

Confesso que a obra — um verdadeiro compêndio sobre a mediunidade — foi, durante muito tempo, a única de Kardec que estudei, e o fiz por curiosidade, já que os fenômenos mediúnicos sempre fizeram parte da minha vida. Ao final de “O livro dos Médiuns”, passei a estudar obras de médiuns católicos simpatizantes do Espiritismo, e assim foi por um longo tempo.

A segunda obra kardequiana que estudei foi “O evangelho segundo o Espiritismo”. Durante anos pratiquei o Culto do Evangelho no Lar, sem perceber que, naquele período, eu era um católico simpatizante do Espiritismo. Julgava-me espírita — e com orgulho — quando alguém perguntava minha religião, e eu respondia prontamente: “sou espírita kardecista”. Hoje, reconheço que isso se tratava de um erro… e de um pleonasmo.

Erro, porque o Espiritismo não é uma religião; pleonasmo, porque, a meu ver, não há “espírita kardecista”. O método é tudo na Filosofia Espírita, e o método espírita se dá pela “universalidade do ensino dos Espíritos”, base do que se chama “kardecismo”. Portanto, se alguém se declara estudioso da Filosofia Espírita, já está, por definição, se declarando “kardecista”.

Quanto a “O livro dos Espíritos”, devo dizer que o primeiro exemplar que adquiri foi em um sebo — uma edição antiga, de capa dura e preta. Comecei a lê-lo em sequência, mas ele não me seduziu. Não o terminei. Coloquei-o de lado e só o lia quando alguma dúvida me visitava. Consultava o glossário e buscava perguntas cujas respostas me interessavam. Por exemplo, se pensava em algo como “perispírito”, ia diretamente às questões relacionadas ao tema.

Após cerca de 17 anos de estudo do Espiritismo, tornei-me expositor da doutrina. Foi então que passei a “devorar” “O livro dos Espíritos” na preparação das aulas que ministrava — mas, ainda assim, de forma não linear. Foi apenas em 2009, quando já somava 20 anos de estudo espírita, que abri o pilar que sustenta a doutrina e o li desde o prefácio até a última página. Fiz isso, confesso, por obrigação profissional: à época, estávamos engajados na criação de um projeto de cinematografia que ficou conhecido como “Projeto Mundo Maior de Cinema”.

Nosso objetivo era convocar estudantes da Sétima Arte a produzirem um roteiro para um filme de curta-metragem que pudesse explicar, por meio da ficção cinematográfica, um capítulo de “O livro dos Espíritos”. Não por acaso, esse projeto acabou resultando no meu primeiro longa-metragem, que estreou nos cinemas de todo o país em 2011 e se tornou o décimo filme brasileiro mais assistido daquele ano.

Com “O Filme dos Espíritos”, recebi, como roteirista, o prêmio de Melhor Roteiro no Festival SESC Melhores Filmes. O filme narra a história fictícia de um homem que, desesperado pela viuvez de sua amada esposa, procura uma ponte sobre o Rio Tietê — que corta grande parte da cidade de São Paulo — para atirar-se sobre suas águas poluídas e “dar fim” à própria vida. Na trama, um gari que ali trabalhava percebe o desespero do protagonista — o personagem que conduz a trama, aquele que agoniza — e se aproxima do candidato ao suicídio. E ele o presenteia com um exemplar de “O livro dos Espíritos”.

Na cena, o profissional da limpeza pública, antes de entregar o livro ao quase suicida, assina na contracapa: “Esse livro mudou a minha vida”. E eu também posso dizer: “mudou a minha vida também”

 

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Postagem efetuada por membro do Conselho Editorial do ECK.

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