Marcelo Henrique
Seguimos no espírito de esclarecimento acerca dos resultados (comparativos) e das conclusões históricas, documentais, jurídicas, doutrinárias e principiológicas que questionam, até o presente momento, a hipótese de autoria integral de Kardec em relação à quinta edição póstuma de “A Gênese”. A quarta edição, de autoria, impressão e distribuição sem qualquer dúvida, por Kardec, é idêntica às três anteriores, com conteúdo plenamente compatível com a Filosofia Espírita.
PRELIMINARES
No ano de 2020, foi constituído um Grupo Virtual de Estudos (GVE), por iniciativa da União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo (USE-SP) por seu Departamento de Doutrina, cuja coordenação coube a Marco Milani. Do grupo, que teve 16 integrantes, residentes em diferentes regiões do país, participaram Marcelo Henrique (autor deste texto), Alexandre Ferreira, Henri Netto, Kátia Pelli, Marco Borges e Nelson Santos, todos membros do ECK, além de outros nove membros, fomentando uma ampla análise doutrinária sobre as alterações das respectivas edições. As atividades foram distribuídas, no estudo preliminar e apresentação dos capítulos, entre os participantes, tendo sido realizadas entre os meses de maio a outubro, semanalmente, resultando na apresentação de um Relatório Final (que serve de base para este ensaio) [2].
Na apresentação dos relatos – assim como já tinha ocorrido durante os meses de estudos semanais, não houve unanimidade interpretativa por todos, o que comprovou tratar-se de um ambiente livre e respeitoso para a expressão de ideias. Um grupo majoritário entendeu que, mesmo contando com correções gramaticais e de formatação, também existiam mudanças na 5ª edição que desfavoreciam a clareza doutrinária de determinados trechos, com o comprometimento de princípios e fundamentos doutrinários e a introdução de conceitos alienígenas.
Em menor quantidade, outro grupo afirmou que todas as alterações teriam sido realizadas por Kardec e, portanto, eram justificadas e melhores do que a edição original e que, não tendo sido o livro impresso com o Professor francês ainda em vida física, ninguém, após a sua morte, teria feito a compilação final para a impressão e a publicação correlata.
Os estudiosos desta polêmica (adulteração ou alteração da obra kardeciana) já conhecem a origem do problema, um artigo publicado em 1884, no jornal “Le Spiritisme”, órgão de divulgação da União Espírita Francesa, intitulado “Uma Infâmia”, de autoria de Henri Sausse, o biógrafo de Kardec (o artigo em questão foi reproduzido nesta Revista, na edição de Abril (https://www.comkardec.net.br/uma-infamia-por-henri-sausse-in-memoriam/). Em resumo, afirmou o espírita francês que as alterações sofridas pela 5ª edição da obra “A Gênese” eram significativas, lançando suspeitas não somente sobre a autoria – pois foi publicada após a desencarnação de Kardec –, mas também sobre a qualidade doutrinária delas. Após um período de acusações e desmentidos envolvendo dirigentes e adeptos franceses, o caso adormeceu.
O tema volta e meia era “reaquecido”, mas em banho-maria, entre pouquíssimos espíritas que, descobrindo o artigo sausseano, protestavam ao conhecer que praticamente todas as traduções disponíveis (para o português e para o espanhol, por exemplo) estavam baseadas na quinta (e póstuma) edição de “A Gênese”.
Mais recentemente, em fins dos anos 1990, em plataformas virtuais de estudo que estavam sendo utilizadas pelos espíritas, na primeira fase do “boom” cibernético, com a popularização dos equipamentos, a expansão das redes de banda larga e a existência das redes sociais (embora ainda rudimentares), o Professor Carlos de Brito Imbassahy, em um dos grupos que estudava “A Gênese”, percebeu, pela leitura dos participantes, que utilizavam traduções brasileiras de diversas editoras, várias e graves discrepâncias de redação e conteúdo, levando o professor a acusar os tradutores, as editoras e as instituições responsáveis. Foi ele, então, buscar um exemplar da terceira edição publicada na França, por Kardec, em francês, e constatou que as citadas traduções não “batiam” com os textos originais, no que concluiu que o problema estaria em alguma outra edição (em francês) que teria servido de base para as traduções. E lembrou-se do artigo de Sausse, acima mencionado.
Contudo, novamente, o assunto arrefeceu.
Foi somente em 2017, após meticulosa, exaustiva e valorosa pesquisa da diplomata brasileira Simoni Privato Goidanich, em documentos originais e instituições de registro e documentação em Paris, que o estudo pôde ser apresentado de forma completa, dando lugar ao livro “O Legado de Allan Kardec”. O trabalho apontou as inconsistências documentais que reacenderam essa polêmica e, novamente, a autoria da 5ª edição passou a ser questionada, bem como suscitou a natural indagação sobre a qualidade doutrinária das alterações. Imediatamente, a Confederação Espírita Argentina, ainda naquele ano, traduziu para o espanhol e publicou a obra “A Gênese” com seu conteúdo recuperado e, no ano seguinte, a Fundação Espírita André Luiz (FEAL), valendo-se de texto do Prof. Imbassahy, já citado, recuperou o texto original na versão em português.
Com este pontapé inicial, outros pesquisadores de diferentes países iniciaram, assim, a busca por fatos históricos que pudessem auxiliar no esclarecimento da questão autoral e, simultaneamente, procederam a análises comparativas sobre as alterações.
Neste diapasão, merece destaque a “Nota” publicada em maio de 2018, pela já citada USE-SP, a qual, movida pela prudência e voltada ao aprofundamento das pesquisas doutrinárias, destacou a pertinência de se considerar a 4ª edição, até então, como aquela em que não havia dúvidas sobre a autoria da obra. Por conseguinte, recomendou aos estudiosos espíritas e não espíritas interessados no assunto, que realizassem análises comparativas entre a edição original e a modificada, num exercício de lógica racional, na esteira do que realizou e recomendou o próprio Kardec.
Feitas estas considerações preliminares, este texto visa sistematizar alguns dos resultados do GVE, que podem servir de baliza e colaboração para todos aqueles que objetivem, ao acessar as edições em francês que são facilmente localizadas na internet e que, também, são encontradas em dois arquivos neste portal, possam, de próprio punho, a partir da redação original na língua francesa, constatarem os pontos alterados e as modificações que compreendem, no nosso entendimento, máculas e agressões ao conteúdo total da Doutrina dos Espíritos, posto que atacam princípios ou fundamentos doutrinários ou se colocam como em oposição ao que Kardec (e os Espíritos Superiores consultados) apresentaram como “teoria espírita” nas demais obras do Professor francês.
O ESTUDO COMPARATIVO E ALGUNS RESULTADOS
Preliminarmente, como já informado acima, em relação às diferenças de interpretação dos dois subgrupos no GVE, foram constatadas e defendidas, em conclusão, por um destes, de que as alterações no texto original importaram em ambiguidades conceituais e em impactos doutrinários (assim compreendidos como mudanças na compreensão sobre princípios e conceitos já firmados no corpo teórico do Espiritismo, apresentados em obras anteriores ou na mesma obra).
Assim sendo e, resumidamente, em sete capítulos (ns. 8, 9, 10, 14, 15, 16 e 18) da 5ª edição foram encontrados tais “problemas”, enquanto em os demais onze capítulos não apresentaram prejuízos ou benefícios doutrinários, totalizando os dezoito capítulos da obra em comento.
Para representar algumas dessas ambiguidades, neste artigo, foram selecionados itens específicos dos capítulos 8, 14, 15 e 18 como claros exemplos de divergências interpretativas.
Por fim, para fins de homogeneidade e clareza de entendimento, utilizaremos a expressão edição original (negritada e sublinhada) para nos referirmos ao conteúdo da obra EFETIVAMENTE publicada por Kardec, em vida, no texto da primeira (que é idêntico ao das segunda, terceira e quarta edições). Por extensão, o termo edição póstuma (também negrito e sublinhado) será correlacionado à quinta edição, publicada após a morte de Kardec.
CAPÍTULO 8
O acréscimo do item 7, no capítulo 8, intitulado “Alma da Terra”, na edição póstuma, gerou, para alguns integrantes do GVE, a impressão de que houve um ganho doutrinário sobre este assunto, pois fora abordada a questão sob um novo ponto de vista, tal como apresentado na Revista Espírita de setembro/1868. Para outros, entretanto, tal item nada agregou doutrinariamente, uma vez que o assunto já teria sido devidamente abordado em obras anteriores, como na questão n. 144, de “O Livro dos Espíritos”, sendo mais adequada a edição original.
CAPÍTULO 14
Com relação ao capítulo 14, dois itens atraíram a atenção dos pesquisadores. O item 1, da edição original, contém o seguinte trecho:
“[…] os fenômenos em que prepondera o elemento espiritual, não podendo ser explicados unicamente por meio das leis da matéria, escapam às investigações da Ciência.”
Na edição póstuma, a palavra “matéria” foi substituída por “natureza”. Assim, a frase se transformou em:
“[…] os fenômenos em que prepondera o elemento espiritual, não podendo ser explicados unicamente por meio das leis da natureza, escapam às investigações da Ciência.”
Alguns consideraram que a substituição não gerou impacto doutrinário pois, ainda que “natureza” pudesse levar a uma interpretação equivocada, em uma leitura isolada, a palavra poderia assumir diferentes significados, estabelecendo-se relações com outras passagens, nesta e em outras obras de Kardec. Logo, não haveria incoerência, se fosse considerada uma perspectiva mais abrangente. O item 1, do capítulo 12, foi citado como exemplo e para analogia, de como os cientistas materialistas definiam milagres: um ato do poder divino contrário às leis conhecidas da natureza. Outros, contudo, apontaram que houve, sim, prejuízo doutrinário por considerarem evidente a distorção semântica entre as palavras e discordaram de que “natureza” e “matéria” poderiam ser consideradas sinônimos. Se assim fosse, se exigiria uma postura relativista, tomando a parte pelo todo, uma vez que os elementos materiais e espirituais são, na obra kardeciana, distintos e a natureza engloba ambos.
Neste sentido, é necessário ponderar que os itens 1, 8, 9, 10, 13, 16 e 17, do capítulo 13 – “Caracteres dos milagres”, da própria obra “A Gênese”, tanto na edição original quanto na edição póstuma, expressam o mesmo sentido lógico quando se usa leis da natureza ou fatos naturais, englobando o elemento espiritual. Portanto, não é compatível com a substituição ocorrida na 5ª edição, caracterizando, assim, evidente prejuízo doutrinário. Portanto, o conteúdo da edição original é considerado doutrinariamente correto e coerente com o conjunto da Filosofia Espírita.
No item 14, do capítulo 14, da edição póstuma, foi acrescentada a afirmação de que o Espírito é um ser “fluídico”. Para alguns, essa afirmação pode estar relacionada com a observação do livro “O que é o Espiritismo”, Cap. 2, item 14, em que se aponta que alma é um ser simples; o Espírito um ser duplo; e o homem um ser triplo. Assim, o homem teria um componente material inseparável e, então, a alteração não geraria qualquer impacto doutrinário, em face desta relação. Para outros, o trecho em análise, na edição original de “A Gênese” é bem mais claro e coerente doutrinariamente, favorecendo a leitura, pois o elemento espiritual se serve do elemento material e eles não se confundem, mantendo a distinção contida na edição originária. Logo, o Espírito não pode ser fluídico, como o seu perispírito o é. No próprio capítulo 2 de “O Livro dos Espíritos”, está clara e inequívoca a diferenciação entre matéria e espírito; portanto, o texto da edição original mantém a coerência e não produz qualquer ambiguidade.
CAPÍTULO 15
No item 59 do capítulo 15, da edição original, conta-se:
“Os outros discípulos vieram com a barca, e, como não estavam distantes da terra mais de duzentos côvados, eles daí puxaram a rede cheia de peixes. (João, 21:1 a 8)”.
Na 5ª edição, foi substituída a palavra “terra” por “mar”, apresentando a seguinte frase “[…] e, como não estavam distantes do mar”. Todos os integrantes do GVE concordaram se tratar de erro na edição modificada, cuja frase está divergente da versão bíblica. Logo, na 4ª edição (edição original) o trecho está mais coerente.
No mesmo capítulo 15, da 5ª edição, o item 67, presente na edição original, foi eliminado integralmente na 5ª edição. O item suprimido propõe as hipóteses plausíveis para explicar o desaparecimento do corpo físico de Jesus após a sua morte. Para alguns, inexiste impacto doutrinário porque hipóteses não fariam parte da Doutrina Espírita, bem como não ficaria comprometida a discussão do tema (o fato de que Jesus teve um corpo carnal), como já destacado em outros trechos neste capítulo. Para outros, a supressão do item 67 acarretou grave prejuízo doutrinário, não somente para o desenvolvimento do conteúdo, mas porque o item suprimido fora considerado relevante por Kardec, tanto que este o citou expressamente nas referências do livro “Catálogo Racional para se formar uma biblioteca espírita”, exatamente para alertar os leitores e se contrapor ao conteúdo do livro “Os Quatro Evangelhos”. Como a questão do desaparecimento do corpo de Jesus é o cerne do trecho compreendido entre os itens 64 a 68, na edição original, a alteração procedida na quinta edição ocasiona incompletude e gera grave prejuízo para a discussão doutrinária, razão pela qual a edição original é a que possui fidedignidade tanto em relação à logicidade da construção filosófico-doutrinária que Kardec emprega nesta temática, como, pelos fatos descritos acima, guarda consonância com outras obras.
CAPÍTULO 18
O capítulo 18 foi um daqueles que mais sofreu alterações, com a inserção de longos textos e mensagens que, mesmo presentes na “Revista Espírita”, não implicam a concordância universal. A simples apresentação do texto nas edições da revista não pressupõe a pertinência doutrinária, vale dizer que para as obras consideradas fundamentais (como é o caso de “A Gênese”) somente a maturação ao longo do tempo e a repetição em outras mensagens de dados argumentos ou conceitos é que fazia Kardec pontuar as mesmas em tais obras. Dentre outros, destacam-se os itens 8, 9, 10, comentados a seguir.
Sobre os itens 8 e 9, as longas inserções realizadas envolvendo a relação entre acontecimentos físicos e a transformação moral dos indivíduos geraram interpretações variadas. Para alguns, não houve impacto doutrinário, porque esta relação teria sido abordada em capítulos anteriores, mencionando-se, por exemplo, os flagelos destruidores e os cataclismos como ocasiões de chegadas e partidas coletivas, bem como as influências destes para a evolução moral dos Espíritos. Para outros, entretanto, as alterações quebraram a sequência lógica do conteúdo original, com a inclusão dos textos de Arago e Dr. Barry, pois Kardec estava discorrendo sobre as transformações morais, valorizando, assim, o livre-arbítrio do indivíduo. E, com as inserções, retomou-se a questão dos acontecimentos físicos atrelados à evolução moral, sinalizando, indevidamente, que a evolução do indivíduo teria uma relação dependente de acontecimentos físicos, caracterizando-se como uma incoerência doutrinária, daí a inteligência da edição original.
Sobre a inserção do item 10, decorre uma situação de vínculo direto entre fenômenos astronômicos e revoluções físicas do globo com o processo de renovação moral da humanidade. Destaca-se o seguinte trecho:
“Anunciando a época de renovação que se havia de abrir para a Humanidade e determinar o fim do velho mundo, a Jesus, pois, foi lícito dizer que ela se assinalaria por fenômenos extraordinários, tremores de terra, flagelos diversos, sinais no céu, que mais não são do que meteoros, sem ab-rogação das leis naturais. O vulgo, porém, ignorante, viu nessas palavras a predição de fatos miraculosos.”
Alguns, no GVE, entenderam que a inserção desse item não causaria impacto doutrinário, pois os acréscimos deveriam ser contextualizados com outras passagens e não deveriam ser lidos isoladamente para a compreensão do conteúdo.
Os demais integrantes do GVE, entretanto, considerando que tremores de terra e meteoros ocorrem incessantemente no planeta, em diferentes gradações e frequências, entenderam que os “sinais no céu” não seriam presságios de mudanças morais da humanidade nem derrogações das leis naturais. Então, é incoerente a afirmação de que seria “lícita” a associação do período de renovação moral a fenômenos extraordinários, como se houvesse um calendário astronômico e geológico. A Astrologia, por sinal, adota a perspectiva da influência dos astros no comportamento e destino do ser humano e tal suposição é plenamente rechaçada pelo ensino dos Espíritos, como observado, por exemplo, nas questões 859 e 867 de “O Livro dos Espíritos”. Assim, o item oferece elementos ambíguos e com prejuízo doutrinário, na edição póstuma.
Na 5ª edição, também, foi inserida uma “Nota” referente ao item 10, apresentada a seguir:
“A terrível epidemia que, de 1866 a 1868, dizimou a população da Ilha Maurícia, teve a precedê-la tão extraordinária e tão abundante chuva de estrelas cadentes, em novembro de 1866, que aterrorizou os habitantes daquela ilha. A partir desse momento, a doença, que reinava desde alguns meses de forma muito benigna, se transformou em verdadeiro flagelo devastador. Sem dúvida houve um sinal no céu e talvez nesse sentido é que se deva entender a frase — estrelas caindo do céu, de que fala o Evangelho, como sendo um dos sinais dos tempos”. (Pormenores sobre a epidemia da ilha Maurícia: Revue Spirite, de julho de 1867, pág. 208, e novembro de 1868, pág. 321.)
Para alguns, não houve impacto doutrinário por não entenderem que a “Nota” faça uma associação direta entre cataclismos como anunciadores da renovação moral, mas que há alterações físicas e morais e elas poderão coincidir. Para outros, entretanto, há evidente prejuízo doutrinário, pois associam-se fenômenos físicos aos morais, de maneira interdependente, razão pela qual a edição original é coerente com o estilo e a concordância doutrinária em relação a outras obras.
CONCLUSÕES
Diferentemente do que os indivíduos mais afeitos à idolatria e ao comodismo intelectual poderiam supor, a proposta analítica realizada pelo Grupo não se baseou na discussão sobre a autoria das modificações ocorridas na 5ª edição, para atestar, a priori, se tais modificações gerariam impactos doutrinários favoráveis ou desfavoráveis. Sob essa perspectiva, buscou-se afastar o relativismo inconsequente que a tudo justifica, culminando com a identificação de trechos questionáveis, ainda que sem qualquer pretensão de unanimidade.
Os resultados comparativos do GVE indicam a existência de passagens com ambiguidade assim como divergências interpretativas sobre os impactos doutrinários gerados pelas alterações ocorridas na 5ª edição de “A Gênese”. O relatório final do GVE, prudentemente, sinaliza que todos os estudiosos e interessados no tema devem analisar os trechos comparados para suas próprias conclusões, assim como evidenciou a relevância e a pertinência da edição original.
Tanto as ambiguidades como as incoerências doutrinárias colidem com a clareza, simplicidade e objetividade da linguagem desejadas pelo educador Allan Kardec, como exemplificado no trecho a seguir, ao tratar do Espiritismo:
“Fala uma linguagem clara, sem ambiguidades. Nada há nele de místico, nada de alegorias suscetíveis de falsas interpretações. Quer ser por todos compreendido, porque chegados são os tempos de fazer-se que os homens conheçam a verdade.” (“O livro dos Espíritos”, Conclusão, VI.)
Kardec e os Espíritos escreveram para o público em geral, aliando profundidade teórica e excelência metodológica, sem a exigência de qualquer formalismo hermenêutico para se compreender os princípios e valores espíritas.
Assim, diante da valorosa oportunidade de estudos e considerando a 4ª edição de “A Gênese” como a mais adequada para parte significativa dos pesquisadores deste Grupo, quando observados determinados itens (sem desconsiderar eventuais aperfeiçoamentos e correções gramaticais realizados no texto da 5ª edição), recomenda-se a qualquer adepto a análise comparativa entre as edições, sob a perspectiva doutrinária, para verificarem, por si mesmos, os eventuais impactos ocorridos e terem suas próprias conclusões a respeito.
Seguimos no espírito de esclarecimento acerca dos resultados (comparativos) e das conclusões históricas, documentais, jurídicas, doutrinárias e principiológicas que questionam, até o presente momento, a hipótese de autoria integral de Kardec em relação à quinta edição póstuma de “A Gênese”. A quarta edição, de autoria, impressão e distribuição sem qualquer dúvida, por Kardec, é idêntica às três anteriores, com conteúdo plenamente compatível com a Filosofia Espírita. Vale mencionar que, entre 1º de janeiro de 1858 (data da fundação da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas – SPEE) até 31 de março de 1869 (data de sua desencarnação) tem-se a presença de Kardec na condição de protagonista e coordenador das ações espíritas pioneiras. Assim, a partir de 1º de abril de 1869 (à exceção do fascículo de abril de 1869, da “Revista Espírita”, que Kardec pessoalmente entregou ao tipógrafo, antes de falecer, tendo sido publicado na sequência), tudo o que foi realizado está sob total suspeita.
Notas do Autor:
[1] A luz se fez, Gênese!
[2] Para os que assim desejarem, o Relatório final do GVE está disponível para consulta e download (<https://usesp.org.br/wp-content/uploads/2020/11/Relatorio-Final-GVE-2020.pdf>. Acesso em 5 de maio de 2023).
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