Manoel Fernandes Neto e Marcus Braga
Na música “Todos estão surdos”, composta por Erasmo e Roberto Carlos (1971), aparece a sentença atribuída a Jesus: “Não importam os motivos da guerra. A paz ainda é mais importante que eles.”
A canção explica:
“Esta frase vive nos cabelos encaracolados
Das cucas maravilhosas
Mas se perdeu no labirinto
Dos pensamentos poluídos pela falta de amor
Muita gente não ouviu porque não quis ouvir
Eles estão surdos”.
Com inspiração hippie, mais de 50 anos depois, a canção é um hino de um mundo tão longe e ao mesmo tempo tão perto. Foi composta em um mundo que assistia atônito a Guerra do Vietnam; mas que agora resgata a mesma aflição, acompanhando outro conflito com desfecho distante: a Guerra da Ucrânia.
Dentro de uma série de edições temáticas que tratam as leis morais de “O livro dos Espíritos”, a Revista Harmonia busca construir pontes de conhecimento. A publicação apresenta nesta edição de maio o tema da Lei de Destruição, na qual a guerra fulgura com destaque, como não podia deixar de ser.
São frases e conceitos que vão habitar futuramente os “cabelos encaracolados” de nossos leitores, em reflexões sobre esses fenômenos causadores de grande sofrimento, mas também de progresso. Destruição é, assim, objeto de discussão no âmbito da doutrina dos espíritos, que traz consolo por enxergar o mais além de todas essas coisas.
Saberes sobre o tema
Na abertura da edição, o consciente texto “Como o Espiritismo interpreta as guerras?”, no qual Marcelo Henrique traz a questão de que, apesar de explicáveis no contexto da doutrina espírita e do progresso das civilizações, os conflitos são sinais de nosso atraso espiritual, e que precisamos encontrar caminhos para abandonar essas formas de interação entre as nações.
Em “O Espiritismo frente às guerras”, Paulo Degering nos faz lembrar que a nossa visão de Deus é de infinita justiça e bondade, e que a guerra, em pleno século XXI, não pode ser debitada da conta da Providência Divina e, sim, das nossas próprias imperfeições. Longe de ser um castigo, é uma oportunidade de progresso e de exercício da fraternidade.
Na mesma linha, Maria Cristina Rivé fala em: “A Destruição… E um mundo mais fraterno”, demonstra que não é o acaso ou a ira divina que se acha escondido por trás das hecatombes e conflitos, estando no homem a semente do que pode vir de bom e de ruim de todo esse cenário que mais uma vez assola nosso mundo.
“A Lei de Destruição e o Instinto de Preservação” é o tema de Neves de Almeida Couras, que navega a partir de sementes e memórias da infância. Reafirma a vida, a necessidade de refazimento e transformação. E traz o homem como centro da sua própria trajetória, na “dança do cosmos”.
A seguir, sob o título “Nuances da Destruição”, a pena de Wilson Longobucco trata da violação das leis de Deus quando estas ultrapassam seus limites. A necessidade de flagelos deve estar inserida em um entendimento maior, na “prestação de contas” pelo abuso da liberdade concedida aos Espíritos.
“Cooperação: um antídoto para o ciclo de destruições abusivas” é o texto da dupla Jair Alves da Cruz e Rosildo Raimundo de Brito, que fazem uma reflexão da “cooperação inserida em todas as leis naturais”: cooperação mútua, união, e o bem comum conquistado no ciclo de regeneração. Os autores reforçam a ideia de que Jesus de Nazaré e o Espiritismo figuram como os “anunciadores de uma nova era”.
Por fim, o fechamento magistral de Julia Schultz, que resgata o poema “Guerra”, escrito em 1999, quando a autora ainda participava de uma juventude espírita. Uma poesia que nos faz ter, em plenitude, a compreensão do tema, entre perdas e conquistas, como ela mesmo arremata: “E que só se aprende a valorizar quando se perde! O bom mesmo é procurar saber o valor enquanto se está perto. E não perder, nunca, uma oportunidade de crescer e ser feliz!”
Manifestos necessários
Cada um desses textos são manifestos para os que têm ouvidos de ouvir, e que fogem da surdez do senso comum do “O amor é importante”, ou “a verdade não mudou”. Tentativas para que a mensagem da fraternidade trazida pelo Espiritismo e por tantas outras doutrinas, seja de alguma forma compreendida entre o estrondoso barulho dos canhões que, na verdade, nunca se calaram no mundo; apenas alternaram momentos de maior ou menor cadência.
Desejamos ao leitor que faça uma boa leitura, apesar da aridez do tema; mas, com a consciência da necessidade de se falar dele. A violência como forma de relação entre pessoas e entre povos campeia com altivez nesse confuso início de século XXI, no qual nos cabe lutar para não repetir os erros do passado. Ou como diz a canção em relação à paz e ao homem:
“Ela está dentro dele mesmo
Ele tem a paz e não sabe
É só fechar os olhos e olhar pra dentro de si mesmo”.
LEIA OS TEXTOS:
Lei da Destruição: “Todos estão surdos!”, por Manoel Fernandes Neto e Marcus Braga
Como o Espiritismo interpreta as guerras? por Marcelo Henrique
A Destruição… E um mundo mais fraterno, por Maria Cristina Rivé
A Lei de Destruição e o Instinto de Preservação, por Neves de Almeida Couras