Dias antes eu havia telefonado a eles.
A encomenda havia chegado.
Meu amigo distante havia me avisado que estavam a caminho, e eu, ao receber o pacote, tratei de combinar com D. Carmem para a entrega.
E o dia chegou!
Aprontei-me com entusiasmo e, em mim, não cabiam os sorrisos.
Poderia ser mais uma visita, comum, igual a todas as outras que há anos ocorrem e perdem-se no tempo.
Não era.
O motivo era único e minhas mãos, seguras de tantos anos e muitas experiências, manifestava expectativa, um pouco trêmulas e com alguma sudorese.
Toquei a campainha e ele me recebeu com um terno olhar.
Abraços, sorrisos.
Curioso e atento como sempre – e isto o peso dos anos não obnubilava – perguntou-me sobre o curioso embrulho que eu carregava.
Eu havia pedido à esposa que nada dissesse a ele, para termos a sensação do inesperado, a surpresa…
Logo, ela chegou e se juntou a nós, com expressão de felicidade.
Conversamos um pouco, e o pacote ficou sobre a mesa. Nos fitando, pacientemente. Até que eu resolvi tocar no assunto.
Disse ao Professor que aquilo era um presente.
Que a encomenda tinha vindo de longe e que os amigos que a enviaram estavam muito felizes em poder fazer chegar-lhe às mãos. Entreguei-lhe o pacote e ele, cuidadosamente foi desfazendo as fitas e descerrando a embalagem.
Logo de cara, a capa do primeiro livro provocou-lhe uma expressão de admiração e encanto. Quase como pegar, pela vez primeira, o filho em seus braços. Aconchegou-lhe ao peito e nos olhou, ternamente… E falou: –
Olha, Carmem! É a minha tradução de “A Gênese”! Veja que bela apresentação, fizeram.
E folheou, percebendo o capricho na apresentação.
Leu os primeiros textos, a apresentação da obra, com olhos levemente marejados, enquanto eu e ela, expectadoras silentes e comovidas, contemplávamos com doçura aquele inesquecível e único momento.
De súbito ele olhou para o alto da sala, parecendo fitar o infinito e agradeceu pela oportunidade de servir.
Quantas milhares de criaturas poderiam, a partir de agora, conhecer um pouco mais e verdadeiramente a mensagem daquele precioso livro, o último do Professor Allan Kardec. Ficamos, ainda, algum tempo juntos.
Ele relembrando das muitas “disputas”, das “contendas” com os “espíritas religiosos” e suas manias, crendices e dogmas. Vez por outra sua voz se tornava mais firme e incisiva, como daquela vez em que ele me disse: – Esses jesuítas infiltrados na doutrina querem acabar com o Espiritismo!
A tarde caía e era preciso me despedir. Não sem antes, para minha alegria e a deles, registrar aquele solene momento num par de fotos.
O criador e sua criatura. O livro e seu estudioso tradutor. Dali para a posteridade. Para o verdadeiro resgate da memória, do pensamento e dos exemplos de um grande homem. Pensei comigo, e expressei:
– Obrigado, Professor Imbassahy! Um abraço, um beijo de pai e a despedida.
Até breve!
Até outro memorável encontro!
No espelho de meu rosto, mais que um sorriso… Para Belvedere Bruno, a “mensageira”.
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