Marcelo Henrique
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Diante deste deplorável quadro, os espíritas sensatos do século XXI, em face de fatos e provas incontestáveis da violência que sofreu a honra, a memória e a obra de Kardec, não podem deixá-lo “morrer” à míngua!
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O homem (Espírito encarnado) Rivail viveu entre 1804 e 1869, na França, e é considerado o “pai” da Filosofia (Doutrina) Espírita, como se sabe. Escreveu mais de três dezenas de livros, adotando o pseudônimo pelo qual foi conhecido: Allan Kardec. Neste 31 de março, completa-se mais um ano de sua despedida do mundo físico e o fato é lembrado por todos os espíritas que conhecem o seu trabalho.
Cético e homem de ciências, investigou como poucos o chamado fenômeno mediúnico, a partir de ocorrências na Europa da segunda metade do século XIX, período em que os Espíritos buscavam a atenção dos homens para a construção de uma nova forma de entender a vida, o mundo e as relações entre os mundos (o dos “vivos” e o dos “mortos”). Minuciosamente, ainda como Rivail debruçou-se sobre os fenômenos e da afirmação categórica de que objetos físicos (mesas) não poderiam ter cérebros e nervos – para se levantarem do chão, flutuarem e dançarem no ar e responder a questionamentos humanos por meio de pancadas (batidas no chão), concluiu que havia um intercâmbio “energético” entre os homens e os Espíritos (desencarnados).
Kardec publicou sua primeira obra, espírita, em 18 de abril de 1857 (“O livro dos espíritos”) e sua última publicação, em vida, foi o exemplar de fevereiro de 1869, da “Revue Spirite” (“Revista Espírita”, que editou de 1858 a 1869), posto que faleceu em 31 de março de 1869, tendo deixado a edição de março pronta na gráfica, aos cuidados do livreiro, para ser publicada. Qualquer outro escrito, a partir dos citados, deve ser visto com muita atenção e com o espírito investigativo, para não permitir elementos alienígenas em relação à sua produção intelectual. É o que se espera de cada espírita, por exemplo, quando se debruçar sobre “Obras Póstumas”, livro levado a público com anotações e rascunhos do Codificador, apenas em janeiro de 1890, 21 anos, portanto, após o desencarne do Mestre lionês. E, também, em relação a qualquer outra publicação que seja considerada como “revisão” dos livros por ele publicados. Todo cuidado, ainda é pouco!
Dizemos isso porque temos, junto a outros pesquisadores e conhecedores do conteúdo principiológico da Filosofia Espírita, trabalhado com muito afinco na preservação do Legado de Kardec, evitando que teorias alienígenas e o “desejo de pacificação”, mediante a imposição de “verdades”, resultem na aceitação de edições póstumas dos livros “A Gênese” e “O Céu e o Inferno”. Comparando-se os textos, com acuidade e esmero, percebe-se diferenças gritantes!
Assim, todas as pesquisas sérias têm resultado na constatação de que há, sim, um significativo número de textos que não tenham sido da lavra do Codificador, incluídos nas citadas obras ou publicadas, ainda em 1869, nos fascículos mensais da “Revue”, a partir da edição de abril/1869.
Como Rivail-Kardec foi quixotesco (alusão ao personagem Dom Quixote) realizando, a seu tempo, a ruptura da verdade das igrejas (católica e protestante) apresentando informações distintas daquelas contidas nas liturgias e homilias destas religiões, acerca de temas da Vida e da Morte e da relação entre os Espíritos (encarnados e desencarnados), é natural que tivesse sofrido, a seu tempo, o combate inclusive de pessoas que, de dentro da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, desejassem o “abrandamento” de certos conceitos. Inclusive para admitir teorias alienígenas como a existência imaterial (fluídica) de Jesus, a virgindade de Maria, a ressurreição de seu corpo, como relatam os textos evangélicos e a condição “ímpar” do homem de Nazaré, como um ser que “ascendeu em linha reta”. Neste contexto, a primeira cisão experimentada pelo nascente movimento francês foi com as ideias de J.-B. Roustaing (e seu livro “Os quatro evangelhos”), claramente mistificadora e apropriadora de conceitos religiosos do Cristianismo e seus dogmas, na ambiência espírita.
Não foi somente na França, mas, igualmente, no Brasil, que o “desejo” da adoção de teses católicas (cristãs) por parte do chamado “movimento espírita” se materializou. Seja em sua origem, com Teles de Menezes, seja com outro Menezes (Adolfo Bezerra de Menezes Cavalcanti) e, também, com Chico Xavier (neste caso, pelas obras de um sacerdote jesuíta, o Padre Manuel da Nóbrega, rebatizado com Emmanuel). Com o Pacto Áureo (1949) e a delimitação de uma estrutura central para os espíritas brasileiros, as ideias de Kardec foram totalmente maculadas com a presença dos elementos acima descritos.
E isto prossegue até hoje! A literatura romanceada “tida como espírita” também contribui para as “misturas” entre crenças pessoais e interpretações particulares, totalmente distantes da concordância universal entre os ensinos dos Espíritos (Superiores). E, neste ponto, palestrantes e articulistas, diariamente, também interpretam o Espiritismo à sua maneira, naquilo que o populacho consagra como “visão espírita” de determinados temas – que de espírita quase nada tem.
Kardec, como Pedagogo e Filósofo, discípulo direto do insigne Pestalozzi, idealista por solitária e herculeamente ter lançado a pedra fundamental dos conhecimentos que hoje divisamos (e que se ampliam a partir do conhecimento por parte de milhões de pessoas, mundo afora, interessados no conhecimento espiritual-espírita) segue, como bem disse o Professor Herculano Pires, como o ilustre desconhecido dos próprios espíritas.
O desconhecimento se materializa então, todos os dias, pelas ações que castigam e desrespeitam sua memória e seu legado. São fissuras que vão se ampliando, na forma de acréscimos, deturpações e adulterações em relação ao lúcido trabalho de Rivail, fazendo com que o nosso “herói” (Kardec) seja um “prisioneiro” daqueles que, infelizmente, deturparam o seu pensamento.
É por isso que, diante deste deplorável quadro, os espíritas sensatos do século XXI, em face de fatos e provas incontestáveis da violência que sofreu a honra, a memória e a obra de Kardec, não podem deixá-lo “morrer” à míngua!
Kardec, portanto, prossegue vivo entre os que valorizam seus esforços e sua ampla e maciça obra e o Espiritismo segue com sua missão de esclarecimento e consolo, preparando a Humanidade do porvir! Avante!
Ótima explanação de Karde e ricas citações.
Primeiramente: espírito não morre, pode haver questionamentos de uns e outros, querendo diminuir ou deturpar sua doutrina, mas está filosofia tem raizes profundas e traz trabalho lindo a humanidade, de forma científica, humanística embasado na ética e Moral, não creio na perda de valores, mas assuntos de sobra para muitos questionamentos que enriquecimento muitas almas estudiosas.
Olá Marcelo, ainda bem que alguns resistem. Parabéns.
Abraços
Excelente texto! Como sempre, o ECK lançando luz sobre a doutrina espírita e nos fazendo refletir e abrir os olhos para a verdade!
A “cristanizacao” e o igrejismo, aliados a uma ascendencia de “santos” na seara espirita, o esquecimento (?) de que o espiritismo nso eh religiao, e sim uma doutrina, que requer ciencia, aliada a feh, criando-se desta forma, uma crosta de abandono dos ideais do Cristo e, forjando uma litertura “ideal” de sem numero de obras, apagando-se de certa a consequente leitura, releitura, interpretacao do que nos legou Kardec.
…,é triste e ao mesmo tempo preocupante o que está se fazendo no Movto Espírita com a Doutrina Espírita.
Onde os atavismo se adentra com bastante “naturalidade” a catolicização tbm.
Não devemos esquecer a célebre frase, q ñ lembro no momento, se de Kardec ou quem.
O Espiritismo Será Aquilo que o Fizerem dele.
Valioso texto, uma breve história que reproduz nossas deformações em relação a essência do pensamento kardecista. Não vamos deixar Kardec morrer!