A humanidade sempre procurou a verdade existencial para compreender a transcendentalidade, a razão do ser no mundo, empreendendo e buscando, com isso, descortinar os mistérios até então velados pela interpretação puramente religiosa.
Nesse contexto, também tive, eu, a minha busca, através do estudo de diversas literaturas, fossem elas científicas, filosóficas, canônicas, apócrifas, místicas, míticas ou espiritualistas. Neste percurso, realizei o primeiro contato com a obra intitulada “O livro dos Espíritos”, cujo subtítulo é Filosofia Espiritualista, obra que contém os princípios de uma nominada Doutrina Espírita, segundo as mensagens e o ensinamento dos Espíritos Superiores recebidas através de diversos médiuns e ordenados por um estudioso, chamado Allan Kardec.
Devorei, sofregamente, página a página, até chegar ao capítulo primeiro, onde encontrei a aristotélica resposta da Espiritualidade dada a Kardec à primeira questão: “O que é Deus?”, cuja resposta é: “Deus é a inteligência suprema, causa primeira de todas as coisas”. A resposta ao item primeiro me remete aos grandes pensadores da Humanidade, para quem o ser – segundo a metafísica – é aquilo que é ou o que existe e, sendo assim, ele é tanto atributo, como existência.
Devo dizer que foi a partir dela, a questão primeira, que um novo universo para mim se descortinou, racional, criterioso e analítico. Ele me permitiu a compreensão da imortalidade da alma, da natureza dos Espíritos e de suas relações com os seres humanos, das Leis Morais, da vida presente, da vida futura e do porvir da Humanidade. Todos eles sem os dogmas cegantes e asfixiantes da religião.
O Espiritismo é uma doutrina, científica e filosófica, renovadora e progressista que permite a libertação do pensar, considerado este como fonte de conhecimento espiritual, moral e social. E que tal é um movimento constante, de evolução e compreensão, pois não há o que supere o amor ao saber.
Ao longo de minha vivência espírita, muitas casas conheci e nelas, de vários cursos participei. Contudo, praticamente em todas elas, pude identificar um dado que é, na minha ótica, preocupante: o livro primeiro de Kardec é um desconhecido, pois não é estudado profundamente. Além disso, há inegáveis equívocos nos métodos de estudo adotados em tais instituições, que relegam o pensamento kardeciano e o ensinos compendiados em “O livro dos Espíritos” a um segundo plano, embora seja ele a “pedra de toque”, o fundamento da Doutrina e que todas as demais obras, escritas e publicadas por ele ou por outros autores, partem do seu conteúdo
Afirmando que a simplicidade do livro inicial é aparentemente ilusória, disserta José Herculano Pires:
“Como no Discurso do Método, de Descartes, a clareza do texto pode enganar o leitor desprevenido. As coisas mais profundas e complexas aparecem na linguagem mais direta e simples, e a compreensão geral do livro só pode ser alcançada por aquele que for capaz de apreender todos os nexos entre os diversos assuntos nele tratados”.
Assim, com imenso pesar, vejo o movimento espírita perder-se em crenças limitantes e dogmáticas derivadas do ranço religioso. Muitos preferem atentar para os romances mediúnicos, que pouco ou quase nada esclarecem e ensinam. Pelo mesmo ranço, há a idolatria daqueles que vão ao centro espírita somente por causa dos guias espirituais, dos médiuns ou dos palestrantes… Nada mais lhes interessa! Não há, então, renovação, não há progresso no conhecimento doutrinário do Espiritismo.
Ao longo destes 164 anos de sua publicação originária, a obra permanece como base e princípio do livre pensamento, o necessário caminho para a evolução do ser humano.
Por fim, merece ser citado Deolindo Amorim, que, aludindo a tal caminho, assevera que “ninguém se libertará totalmente sem esforço constante e perseverante para buscar a verdade”.
Nelson Santos