Henri Sausse (in memoriam) [B]
Sobre uma sociedade espírita, fundada para a continuidade das obras de Allan Kardec, depositamos sobre ela atenção e cuidado para garantir a integridade do patrimônio moral que nos foi deixado pelo mestre. O que não sabíamos é que, ao lado desta, talvez até à sua sombra, se organizava uma outra, voltada para a corrupção das obras fundamentais de nossa doutrina, e esta última, não só exista, mas talvez continue ainda com sua triste tarefa.
Queiram me perdoar , irmãos e irmãs em crença, se eu me deixei levar pela indignação que de minha alma transborda.
Eu deveria expulsar do meu coração todos os pensamentos de raiva e ódio. Há, no entanto, circunstâncias em que não sabemos dominar uma justa indignação.
Todos nós sabíamos que havia uma sociedade espírita, fundada para a continuidade das obras de Allan Kardec, e depositamos sobre ela atenção e cuidado para garantir a integridade do patrimônio moral que nos foi deixado pelo mestre. O que não sabíamos é que, ao lado desta, talvez até à sua sombra, se organizava uma outra, voltada para a corrupção das obras fundamentais de nossa doutrina, e esta última, não só exista, mas talvez continue ainda com sua triste tarefa.
Não sei se todas as obras de Allan Kardec foram manchadas por mãos ímpias, mas descobri que havia pelo menos uma, “A Gênese”, que sofreu mutilações importantes.
Chocado por estas três palavras: Revista, Corrigida e Aumentada, impressas logo abaixo do título da quinta edição, tive a paciência de confrontar, página por página, linha por linha, esta quinta edição com a publicada em 1868 e que eu havia comprado quando da sua publicação.
O resultado do meu trabalho é este. Comparando os textos da primeira e quinta edições, descobri que 126 passagens haviam sido modificadas, adicionadas ou excluídas.
Destas, onze (11), foram objetos de uma revisão parcial. Cinquenta (50) foram adicionadas e sessenta e cinco foram removidas, não conto ainda os números dos parágrafos alterados ou os títulos adicionados.
Todas as partes deste livro sofreram mutilações mais ou menos sérias, mas o capítulo XVIII: Os tempos são chegados, é aquele que foi mais maltratado. As modificações nele feitas, o tornam quase irreconhecível.
Agora, você vai me perguntar, quem são os culpados? Qual foi o motivo destas manobras? Destaco da primeira edição de “A Gênese” somente uma das passagens excluídas, o que já basta para que vocês julguem quem deve se
beneficiar com esta infâmia:
“A GÊNESE, EDIÇÃO DE 1868, CAPÍTULO XV. OS MILAGRES DO EVANGELHO, PÁGINAS 379 E 380, ITEM 67.
Em que se transformou o corpo carnal? É um problema cuja solução não se pode deduzir, até nova ordem, salvo por hipóteses, falta de elementos suficientes para assegurar uma convicção. Esta solução, aliás, é de uma importância
secundária e não juntaria nada aos méritos do Cristo nem aos fatos que atestam, de uma certa maneira bem contrariamente peremptória, sua superioridade e sua missão divina.
Não pode, pois, haver sobre a maneira na qual esse desaparecimento se operou senão opiniões pessoais que teriam valores apenas igualmente quanto as que fossem sancionadas por uma lógica rigorosa e pelo ensinamento geral dos Espíritos; ora, até o presente, nenhuma das que foram formuladas recebeu a sanção deste duplo controle.
Se os Espíritos ainda não resolveram a questão pela unanimidade de seus ensinamentos, é que, sem dúvida, o movimento da resolução não veio ainda ou que ainda falta conhecimentos em auxílio dos que possam resolvê-la por si própria. Em atentando, descarta-se a suposição de um rapto clandestino, poder-se-ia encontrar, por analogia, uma explicação provável na teoria do duplo fenômeno dos transportes e da invisibilidade”.
A supressão desta passagem deixa muito claro a quem Allan Kardec foi vendido para que seja necessário insistir nesse ponto. Todos os espíritas sabem a quem se aplica o segundo parágrafo, grifado por mim mesmo.
***
ADENDO:
CONHEÇA AS MODIFICAÇÕES OCORRIDAS EM A GÊNESE
Para aqueles que queiram pesquisar as modificações sofridas por A Gênese, aqui estão os números das páginas onde podem encontrá-las:
Passagens modificadas – páginas: 68, 79, 85, 105, 148, 155, 181, 203, 205, 215, 429 (onze).
Passagens adicionadas – 5ª edição – páginas: 10, 16, 17, 48, 52, 73 (75 e 76), 84, 104, 127, 133, 138, 142, 159, 174, 176, 178 (188-89), 194, 196, 201- 2-3-4) 212, (220-21) 223, 234, (240-41), 245, 251, 257, 274, (276-77-78), 284, 286, 301, 310, 311 (312). -13), (314-15), 315 (315-16), 320, (367-68), 376, 394, 399, 424, 433, 436 (448-49-50-51-52-53-54), 455 (cinquenta).
Passagens suprimidas – Edição de 1868 – Páginas: 12, 23, 47, 48, 50, 54, 58, (59-60), (61-62), 65, 69, 73, 74, 78, 82, 83, 85, 86, ( 87-88), 88, 93, 95, 97, 118, (145-46-47), 165, (173-74), 177, 181, 189, 190, 192, 195, 203, 204, 205, 229 , 232, 243, (244-45) 247 *, 251, 263, (267-68 *) 270, 279, 303, (304-5), (379-80) 385, (385-86), 389, 392, 393, 403, 411, 412, 433, (435-36), (439-40), (441-42), (444-45-46), (447-48), (451-52-53)), (sessenta e cinco).
P.S.: A eliminação de passagens marcadas com * é significativa.
Nota do Tradutor: Artigo de Henri Sausse (biógrafo de Allan Kardec), publicado na 1a quinzena de dezembro de 1884, na revista “Spiritisme”. Tradução de Álvaro Ramos.
Notas do ECK:
[A] Artigo publicado no blog da União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo (USE), Distrital Vila Maria, sob o título “A adulteração de “A Gênese”, segundo Henri Sausse.
[B] Henri Sausse (1852-1928), escritor espírita, foi o primeiro biógrafo de Allan Kardec (“Biographie d’Allan Kardec”), sendo autor, também, da biografia de León Denis, e mais oito obras.
Foto de Henri Sausse, de la web blog espirita de mari